José Luiz Runco foi demitido do cargo de chefe do departamento médico do Flamengo. O comentário vazado do doutor sobre a condição física do meio-campista uruguaio Nico De la Cruz a um grupo de WhatsApp, gerou uma nova crise na Gávea e sua posterior demissão. Runco ainda pode ser alvo de medidas legais do atleta uruguaio, por suposta quebra de sigilo médico.
O site ge publicou na última terça-feira, 22, o vazamento da mensagem de Runco ao grupo “Flamengo Barra”, na qual o médico cita uma “lesão crônica e irreparável”.
“Prezado João. Boa tarde. Vou tentar passar a situação do De la Cruz. Jogador comprado em outra gestão, sem a menor condição, pois apresenta uma lesão crônica e irreparável no joelho direito, e uma lesão também no joelho esquerdo. Como somos bípedes, temos dificuldades de equilíbrio e equilíbrio muscular se algum membro já estiver afetado. Estamos tentando fazer o possível para que ele possa participar, mas é muito complicado. E, quanto à venda, só se houver algum clube que tenha interesse por outro motivo e não para jogar futebol competitivo. Atenciosamente”
Nesta quarta-feira, 23, o clube optou pelo desligamento do profissional, que chefiava todos os departamentos médicos do clube, mas não atuava especificamente no futebol. A informação da demissão foi inicialmente divulgada pelo jornalista Bruno Castanha.
O caso gerou enorme desconforto entre atletas e comissão técnica. Por meio das redes sociais, De la Cruz se pronunciou ao publicar uma foto com a legenda: “Nunca deixe que ninguém te diga que não pode fazer algo”. O compatriota Arrascaeta postou uma foto a seu lado, com a mensagem: “se trata de cuidar dos nossos, simples assim.”
Dias depois de solucionar a situação envolvendo Pedro, diretoria e o técnico Filipe Luís, com o atacante marcando o gol da vitória sobre o Fluminense, o Flamengo se viu envolto em mais uma crise interna.
Segundo informações do canal uruguaio El Espectador, o estafe de De la Cruz enxerga quebra de sigilo médico por parte de Runco e cogita tomar medidas legais contra o experiente profissional com longa passagem pela seleção brasileira.
De La Cruz, de 28 anos, chegou ao Flamengo vindo do River Plate, contratado por R$ 102 milhões, no início da temporada 2024. À época, a imprensa argentina já falava em uma “lesão crônica” no joelho esquerdo. Oficialmente, o jogador da seleção uruguaia não participou do último Fla-Flu por decisão técnica técnica de Filipe Luís.
Houve quebra de sigilo médico?
PLACAR procurou médicos com experiência no futebol profissional para avaliar o caso. Um deles disse, sob anonimato, que Runco, de fato, cometeu um desvio ético ao comentar sobre o caso fora do ambiente profissional. “Não pode, ele deu muito mole”, comentou. Os outros preferiram não comentar. O Conselho Regional de Medicina do RJ (Cremerj) ainda não respondeu ao contato da reportagem.
Gustavo Justino de Oliveira, Professor de Direito Administrativo na Usp e no Idp (Brasilia e SP), considera ter havido quebra de sigilo. Confira, abaixo, sua avaliação:
A divulgação feita pelo Dr. José Luiz Runco, contendo informações clínicas específicas sobre o atleta Nico De La Cruz, configura, em tese, quebra de sigilo médico, salvo se houver autorização expressa do jogador, o que, aparentemente, não ocorreu.
O Código de Ética Médica (art. 73) proíbe expressamente a revelação de fatos obtidos em razão do exercício profissional sem consentimento do paciente, e essa obrigação se mantém independentemente do canal utilizado, seja formal ou informal, presencial ou digital.1 O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem jurisprudência consolidada nesse sentido.
Em decisão recente, no AgRg no RHC 181907/MG, a Corte reconheceu que a comunicação de fatos clínicos por um médico à autoridade policial, sem autorização do paciente ou previsão legal, violou o sigilo profissional. A relatora, Ministra Daniela Teixeira, destacou que o sigilo médico é protegido por norma de ordem pública e não pode ser relativizado fora das hipóteses
legais.
Apesar de tratar de contexto distinto, o precedente se aplica ao caso do atleta, pois o núcleo da decisão é a divulgação indevida de dados médicos sem justa causa, o que também compromete a confidencialidade e expõe o atleta a possíveis danos ao dizer “só se houver algum clube que tenha interesse por outro motivo e não para jogar futebol competitivo”.
Dessa forma, se confirmada a divulgação sem autorização, há respaldo jurídico para que o atleta adote medidas legais, inclusive por danos morais, em razão da exposição indevida de sua condição clínica.
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